A CRIMEIA PARECE VOLTAR A FAZER LEMBRAR O SEU PASSADO COM TENSÃO ENTRE OCIDENTE E RÚSSIA A AUMENTAR EM VÁRIOS PONTOS ESTRATÉGICOS
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segunda-feira, 3 de março de 2014

A CRIMEIA PARECE VOLTAR A FAZER LEMBRAR O SEU PASSADO COM TENSÃO ENTRE OCIDENTE E RÚSSIA A AUMENTAR EM VÁRIOS PONTOS ESTRATÉGICOS

A CRIMEIA PARECE VOLTAR A FAZER LEMBRAR O SEU PASSADO COM TENSÃO ENTRE OCIDENTE E RÚSSIA A AUMENTAR EM VÁRIOS PONTOS ESTRATÉGICOS


Por Paulo Ramires


BREVE HISTÓRIA DA CRIMEIA

 
Ilustração mostrando o "Cerco de Sevastopol", durante a Guerra de Crimeia, entre 1854 e 1855, uma Guerra em que a Rússia se envolveu para "proteger"os lugares santos dos cristãos - wikipedia.



A Crimeia é um território localizado junto da costa setentrional do Mar Negro entre o continente europeu, a Anatólia e o Cáucaso, sendo uma porta de acesso importante através de diversos estreitos para o mar Mediterrâneo e o mar Egeu, dando através deles acesso ao Atlântico. É uma zona estratégica muito importante que ao longo dos tempos foi disputado por diversas potencias ou impérios. O território foi inicialmente povoado por diversos povos da antiga Grécia que ai procuraram refugio tal como, dórios ou jónios. Foi depois controlada pelo império Romano quando este se afirmou no mediterrânico. Mais tarde chegaram povos do norte da Europa e Euroásia tais como Godos, Hunos, etc... Já no século VIII foi tomada pelos cázaros, um povo de origem turcomana que dominou a região centro-asiática. Em 1016 foi controlada pelo Império Bizantino, e pelos Kiptchaks, e ainda pelos Mongóis em 1237. No século XIII eram os genoveses que dominavam o mediterrânico e a partir de 1478 foi o Império Otomano que tomou conta do território até à guerra russo-otomana que durou entre 1768 e 1774 terminando com a derrota dos otomanos. Após a guerra é assinado o tratado de Küçük Kaynarca (1774) que colocava a Crimeia como território independente em resultado de os otomanos terem sido obrigados a renunciaram os seus direitos de soberania sobre o Canato [estado islâmico turcomano sob a influência de diversas potências na Europa Oriental] da Crimeia, a derrota imposta aos otomanos foi da responsabilidade do general russo Suvorov, ficando assim toda a Crimeia sob a influência da Rússia, todavia o Império Russo violou o tratado e e em 1783 a Crimeia acabaria por ser integrada no Império Russo.

Guerra da Crimeia 1853 -1956
Entre 1853 a 1956 dá-se a Guerra da Crimeia que opôs o Império Russo a uma grande coligação de impérios e potencias nomeadamente o Reino Unido, a França, o Reino da Sardenha - formando a Aliança Anglo-Franco-Sarda - e o Império Otomano e que contou também com o apoio do Império Austríaco, e que visava conter as pretensões expansionistas russas pelo ocidente e sul.

Durante a segunda Grande Guerra Mundial, os alemães invadira a Crimeia em 1941, onde ai aconteceu uma das batalhas mais sangrenta, os alemães tomaram conta de todo o território com a excepção da cidade de Sebastopol, que resistiu até os alemães capturarem a cidade em 1942. Em 1944 as tropas soviéticas tomam conta de todo o território. A Crimeia era então integrada como parte da República Socialista Federada Soviética da Rússia, no entanto, em 1954, foi transferida por Nikita Khrushchov para a República Socialista Soviética Ucraniana como presente de comemoração do 300° aniversário da unificação da Rússia e da Ucrânia.

Com o colapso da União Soviética a Crimeia permaneceu integrada na Ucrânia, mesmo com a independência desta, mas os problemas começaram a surgir com o cada vez maior ressentimento da população de maioria russa ou russófono causadora de tensões crescente entre a Rússia e a Ucrânia. A agravar esta situação foi a crescente instabilidade da Frota do Mar Negro sob o controlo dos russos baseada na península.

A SITUAÇÃO DA CRIMEIA


Tropas russas na Crimeia, Ucrânia

A actual situação na Ucrânia não pode ser vista apenas por vários acontecimentos ocorridos no território deste país localizado entre a Euroásia e a Europa, de facto a situação é apenas um ponto de tensão entre muitos entre Washington e Moscovo, tais como a Síria e outras regiões do Médio Oriente, Paquistão ou a Gronelândia ou ainda outros assuntos tais como as armas estratégicas onde as duas super-potencias têm grandes divergências.

Sevastopol - base naval russa situada Crimeia, Ucrânea


Sevastopol - base naval russa situada Crimeia, Ucrânia
No caso da Ucrânia foi a iniciativa dos EUA de fazer cair o governo do presidente eleito Víktor Yanukóvych que percepcionou todos acontecimentos. Victória Nuland coordenou desde o início com o embaixador Geoffrey R. Pyatt [veja aqui a conversa telefónica]e os partidos da oposição ucraniana tendencialmente de extrema direita nacionalista e populista ou mesmo nazis como Oleh Tyahnybok lider do Svoboda. O afastamento de Yanukóvych da confiança de Putin e do Kremlin tinha de ser executado pois não servia os interesses da NATO. Assim o que aconteceu na prática foi um golpe de estado com a aparência de uma qualquer revolução. É verdade que muitos ucranianos se manifestaram contra os elevados índices corrupção do país, mas não foi esse o factor que afastou Víktor Yanukóvych, até porque Yúlia Timochenko antiga primeira ministra tem também problemas com essa questão e teve um tratamento bem diferente.  Os acontecimentos na praça Maiden e posteriormente da proibição da língua russa e a perseguição aos pró-russos em Kiev num país fronteiriço da Rússia fazia prever esta reacção - a invasão da Crimeia se assim se pode dizer. Putin não tinha escolha, ou invadia ou ficava sem a base naval  em Sevastopol que durante 200 anos serviu os interesses russos, pois possivelmente a Ucrânia será integrada na NATO. 

A decisão politica de invadir a Crimeia é tão ilegítima como a subida ao poder do actual governo da Ucrânia. Mas o que se está aqui a desenhar não tem apenas a ver com a base naval russa na Ucrânia, a NATO tem seguido uma politica de provocar o isolamento da Rússia, afastando-a cada vez mais da UE e do Médio Oriente, isto é claro nas palavras de conselheiros para a politica externo e de segurança dos EUA como Zbigniew Brzezinski, dai a insistência e a pretensão de Washington de colocar um sistema de defesa anti-misseis na Polónia desenvolvido por um conjunto de empresas, a companhia francesa Thales, o consórcio italo-americano-alemão MEADS, a companhia americana Raytheon e o grupo MBDA. Trata-se de o regresso das armas estratégicas à Europa depois do chanceler alemão Helmut Kohl e o antigo presidente francês Miterran terem acabado com elas na Alemanha. 

A Rússia com outras antigas republicas da União Soviética também pretende desenvolver uma União Económica com um mercado comum semelhante à CEE - um integração económica das repúblicas da Euroásia - algo que desagradou aos EUA e à UE, mas a UE depende bastante do fornecimento do gás Russo, assim como a Rússia depende das vendas de energia à UE, o ideal seria um espaço comum como o previsto após o fim da guerra fria em todo o continente, mas não parece ser esse o caminho desejado. De facto perspectivas várias guerras comerciais entre um espaço que está a ser criado entre a UE e os EUA - apesar de os europeus não serem tidos nem achados nessa questão -  e o espaço BRICS formado pela China, Rússia, Índia, Brasil e África do Sul. Mas a tentativa de conter a futura União Económica da Euroásia por parte dos EUA mostrou bastantes fragilidades na Europa, desde logo que foi a NATO a substituir as iniciativas da UE e com tudo isto é a própria UE que arrisca também bastante com um foco de nacionalismo "pró europeu" e anti-europeu, sendo que os nacionalistas ucranianos não serão assim tão pró-europeus como se possa pensar, aumentando ainda mais a enorme dependência da super-potencia americana. No entanto há que se saber agora quem irá colocar os enormes montantes de dinheiro que a Ucrânia necessita para evitar a falência e em que moldes isso acontecerá, uma coisa é certa a Ucrânia continuará a depender bastante do gás russo, e uma boa parte da economia ucraniana é feita com a Rússia e não com a UE, o mais sensato nesta questão volto a dizê-lo seria a Ucrânia integrar os dois espaços de alguma forma.

CONSIDERAÇÕES FINAIS DO ARTIGO

Segundo a discussão que se tem gerado sobre a ocupação das forças russos no território da Crimeia, não é verdade que a Rússia esteja a violar a soberania da Ucrânia ou a legalidade internacional, a Ucrânia e a Rússia têm um acordo desde 28 de Maio de 1997, em que ambos partilham a frota do Mar Negro e as instalações da respectiva base naval situada em Sevastopol, situada Crimeia. Mas isto não quer dizer que ensaiar operações militares no território da Crimeia, e tomar o controlo do território, inclusivo bases ucranianas e as telecomunicações o seja. 

No entanto o problema é tão complicado que o poder que se encontra em Kiev é ilegítimo, qualquer poder ou governo que derrube um outro legitimamente eleito será sempre um golpe de estado, e logo este é ilegítimo. O presidente legítimo para todos os efeitos parece ser Víktor Yanukóvych, que por sua vez pediu para que a Rússia intervenha no território da Ucrânia, para manter a ordem:

"Sob a influência dos países ocidentais, ex actos abertos de terror e violência", Churkin citou a carta de Yanukovich a Putin na terceira reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU.

"As pessoas estão a ser perseguidos por razões linguísticas e políticas". "Assim, por esta razão venho solicitai ao Presidente da Rússia, Sr. Putin, pedindo-lhe para usar as forças armadas da Federação Russa para estabelecer a legitimidade, a paz, a lei e a ordem, a estabilidade e defender o povo da Ucrânia."
O mesmo fizeram diversos deputados ucranianos que apelaram domingo ao presidente russo, Vladimir Putin para reconsiderar a implantação de tropas adicionais na Crimeia, a fim de evitar a escalada militar da actual crise política no país, refere o site da marinha russa.


Segundo o acordo da Ucrânia com a Rússia sobre a frota do Mar Negro e a presença na base Naval refere o seguinte:

Em 1997, a Rússia e a Ucrânia assinaram o Tratado de partição, estabelecendo duas frotas nacionais independentes e dividindo armamentos e bases entre eles. A Ucrânia também concordou em arrendar partes importantes das suas novas bases em Sevastopol na Crimeia - cerca de 18 240 ha de terra na Crimeia e Sevastopol para as necessidades de sua frota do Mar Negro que faz 0,03% da área total da Ucrânia (603 700 km quadrados - para a Frota russa do Mar Negro até 2017.

Um novo acordo foi assinado a 21 de Abril de 2010, em Kharkiv, na Ucrânia, pelo presidente ucraniano, Viktor Yanukovych e o presidente russo, Dimitry Medvedev e que consistia na extensão do contrato de arrendamento da base naval do Mar Negra por mais 25 anos após o seu termo em 2017, ou seja até 2042 e com uma opção de renovação cinco anos adicionais até 2047. 

Em troca a Ucrânia obteria descontos no preço do gás russo, bem como receber em receitas pelo arrendamento da base naval da Crimeia a Moscovo um montante de 98 milhões dólares americanos por ano entre outros investimentos directos e gastos na compra de vários produtos ou serviços. Assim, as despesas totais da Rússia com a Frota do Mar Negro totalizam mais de $ 350 milhões por ano.




Uma outra análise para a compreensão geopolítica da Crimeia e da base naval:








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